quinta-feira, 31 de março de 2011

O Exemplo do Modelo Chinês

Neste período de conturbada violência que afecta os países do Norte de África, cujas réplicas se fazem sentir por todo o continente africano, faz sentido, analisar a acalmia que existe na China.
Numa primeira análise poderíamos concluir que todos estes países têm uma característica em comum, são em essência regimes ditatoriais. No entanto, dentro deste universo de regimes ditatoriais, o modelo chinês, é completamente diferente. É esta diferença que explica a acalmia em que vivem os chineses.
O regime na China assenta no Partido Comunista, que funciona num sistema de planificação e renovação do poder. Isto implica que após um determinado período de tempo os dirigentes políticos vão sendo substituídos. Todo o processo de substituição é meticulosamente planeado, os prazos são rigorosamente estabelecidos e além disso são conhecidos por todos de forma antecipada.
Assim, em 2012, sem surpresas, Hu Jintao será substituído no seu cargo de Secretário-Geral do Partido Comunista Chinês, e em 2013 será substituído no seu cargo de Presidente da República. Tal como sucedeu em 2002/2003, quando Hu Jintao substitui Jiang Zemin. O poder na China é planificado ao milímetro e sem medo de ser renovado, podemos constatar que Hu Jintao apenas irá ocupar dois mandatos em cada um destes cargos, tal como, foi estabelecido pelo Partido Comunista Chinês. Este factor é de extrema importância porque retira o carácter pessoal ao poder, ou seja, não existe uma personalização do poder, tal como, sucede nos outros regimes ditatoriais, onde existe inclusive um culto da personalidade. Esta ideia é reforçada quando analisamos o Congresso do Partido Comunista Chinês de 2007, onde 60% do Comité Central foi renovado.
A renovação planeada do Partido Comunista Chinês é uma das chaves do seu sucesso, a outra chave fundamental do seu sucesso reside no sistema de meritocracia que foi estabelecido e interiorizado pelo Partido. Este sistema de meritocracia implica um conjunto de mecanismos que apenas permite a ascensão no interior do Partido dos quadros mais capacitados e mais competentes. Este factor é essencial no sucesso do Modelo Chinês porque além de não existir uma personalização do poder, não dá azo para sucessões hereditárias no poder, tal como, sucede noutros regimes ditatoriais. Além disso, a cultura de meritocracia no Partido Comunista Chinês teve a grande virtude de reprimir fortemente a corrupção, o nepotismo e a ineficiência económica.
Este forte sistema de selecção implementado no interior do Partido Comunista Chinês permitiu desenvolver uma grande capacidade de adaptação da China a um mundo em permanente mudança e além disso uma grande flexibilidade para implementar reformas quando elas eram mais necessárias. A China adquiriu sentido de antecipação e de oportunidade. A título de exemplo, as reformas no sistema bancário, a aprovação de novas leis laborais, a rápida resposta a crise de 2008 ou a nova política para alterar o modelo de crescimento da economia chinesa. Portanto, grande parte do êxito económico chinês deve-se à capacidade dos seus dirigentes políticos, este êxito explica em grande medida acalmia que se vive na China.

segunda-feira, 21 de março de 2011

A Figura José Eduardo dos Santos

A historia de Angola e do MPLA estão intimamente ligadas, bem como, a história de José Eduardo dos Santos. O MPLA foi o grito de libertação de Angola, a acção e o pensamento. O MPLA é um partido complexo, como todos os grandes partidos. No seu interior existem diversas linhagens, tendências e susceptibilidades.
O MPLA seria um partido de equilíbrios instáveis senão existisse José Eduardo dos Santos, ele é um factor de unicidade interna, o MPLA reforça-se na pessoa de José Eduardo dos Santos e ele no MPLA. É uma força que se auto-alimenta pela sabedoria com que José Eduardo dos Santos gere as diferentes sensibilidades que coexistem dentro do MPLA. Ele é o elemento que não permite a desintegração do MPLA, consolida todas as fracturas que possam existir no seio do partido. É uma figura omnipresente, no MPLA e na vida Angolana. Por isso, a questão da sucessão política no MPLA, e por inerência, em Angola, é problemática porque a ausência política de José Eduardo dos Santos gera um vazio e uma incerteza tremenda, tanto no partido como no país. Chegamos a uma daquelas relações extremas da vida, onde um não existe sem o outro.
Mas a vida de José Eduardo dos Santos já não lhe pertence, porque passou da categoria dos meros humanos à categoria de figura histórica, a sua vida e todo o seu trajecto de vida, é indissociável da vida de Angola e de todos os Angolanos. Talvez, José Eduardo dos Santos não tenha essa consciência, ele já não é um mero mortal, é um actor da história, para o bem e para o mal.
A questão, é saber que espaço da história José Eduardo dos Santos quer ocupar, não somente em Angola, mas também no continente africano. Será que José Eduardo dos Santos quer ser um desprestigiado Mugabe que insiste em eternizar-se até a morte no poder? Será que José Eduardo dos Santos quer ser um desprestigiado Mubarak que foi deposto pelo seu próprio povo? Será que José Eduardo dos Santos quer ser um desprestigiado Kadhafi que vai ser chacinado pelos aliados? Ou será que José Eduardo dos Santos quer ser um prestigiado Mandela, um Estadista que construiu os pilares da democracia em Angola, que soube conduzir o seu país a bom porto, na senda do desenvolvimento sustentando e do progresso?
A escolha depende exclusivamente, de José Eduardo dos Santos, ele tem que decidir que espaço quer ocupar na história mas não pode esquecer em nenhuma circunstância a História é sempre um Juiz Implacável.

quinta-feira, 10 de março de 2011

A Letargia Democrática

O vento soprou suave sobre a cidade de Luanda apesar do tom bélico que comprimia o céu e ameaçava tempestade. Assim poderia começar a crónica sobre uma manifestação anunciada.
O anúncio varreu toda a internet, um pouco a imagem do que aconteceu no hemisfério norte do continente. A voracidade do fenómeno precipitou um histórico do MPLA a vir a público para deixar um aviso a navegação: O poder não vai cair nas ruas.
Estas declarações pressupuseram o primeiro erro trágico do MPLA na gestão desta situação, pois elas tiveram o dom de dar notoriedade pública a manifestação e amplificar todo o fenómeno. Os meios de comunicação nacionais e estrangeiros registaram com especial interesse o teor das declarações e fizeram o respectivo eco. Além do conteúdo ser impróprio, passou um atestado de menoridade ao Governo, ao Estado e a Nova Constituição.
No MPLA ainda se fez luz, convocou-se uma contra-manifestação de apoio ao Governo na pessoa do Presidente José Eduardo dos Santos. A contra-manifestação poderia ter tido efeitos virtuosos para o Governo, se tivesse sido devidamente, organizada e capitalizada. Mas não foi isso que aconteceu.
No dia da Manifestação, apresentaram-se 17 cidadãos na Praça 1º de Maio em Luanda, um número insignificante, principalmente, se tivermos em conta as expectativas que se geraram em torno do evento. Foi precisamente neste momento que se cometeu o segundo erro trágico, as autoridades policiais detiveram os 17 manifestantes e impediram a manifestação. O que foi noticia, não foi o facto da manifestação ter somente mobilizado 17 manifestantes, mas sim o facto, de 17 manifestantes terem sido detidos e impedidos de exercer um direito fundamental que esta consagrado na Constituição Angolana. O mais caricato uma Constituição recentemente aprovada e a imagem do MPLA.
Os manifestantes, os promotores da manifestação, em vez de saírem desacreditados e desmoralizados, saíram reforçados. Conscientes ou não do seu novo poder. Verificamos que bastam 17 cidadãos anónimos e mal organizados para provocar um ataque de pânico no MPLA e no Governo. A tendência natural, será para convocar novas manifestações porque é uma forma efectiva de colocar o MPLA e o Governo em zonas de desconforto. Esta nova situação pode ser bastante problemática, não só para o Governo/MPLA que não sabe reagir de forma adequada a este tipo de situações, mas também para os outros partidos políticos que vêem como movimentos espontâneos da população têm maior impacto e mais poder reivindicativo do que os próprios partidos da oposição, ou seja, estas manifestações são um atestado de incompetência aos partidos políticos da oposição, que sendo estruturas organizadas não são capazes de promover acções com mesmo impacto que 17 manifestantes anónimos concentrados numa praça de Luanda.
A tendência lógica será para os partidos da oposição associarem-se a estas manifestações ou então organizarem as suas próprias manifestações, e capitalizar a falta de senso comum do Governo/MPLA para gerir estas situações. Se a oposição política não se associar a estes movimentos espontâneos e de cariz pacifista, os próprios partidos ficam em causa, porque a população começará a questionar-se sobre a utilidade destes partidos, porque um partido que não esta no poder, e ainda por cima não faz oposição, é um partido que não faz sentido. Muitos projectos políticos poderão ser inviabilizados, se passarem a ser substituídos por estes movimentos espontâneos da população. Como disse, um dos manifestantes detidos, acaba de se abrir uma caixa de Pandora em Angola.