sexta-feira, 13 de julho de 2012

A Teoria do Medo

As primeiras manifestações em Luanda surgiram um pouco depois da primavera árabe, a reacção do regime foi visceral, ao ponto, de ser considerada temerária e patética. Na fase inicial, os principais partidos da oposição adoptaram posições neutrais, não caíram na tentação do aproveitamento político através da demagogia e do populismo fácil, sempre tão frequentes nestas ocasiões, mas o descontentamento existia e era real.
No entanto, com o intensificar do fenómeno, assistiram-se à manifestações de apoio ao Governo e as respectivas contra-manifestações, algumas de grande alcance, surpreendentes ou não, pela sua grande capacidade de mobilização, tendo em conta os parcos meios de alguns partidos na cena nacional.
O vento passou, e as sementes foram lançadas, apenas os ditos temerários eram conscientes do alcance destas manifestações. Os restantes mortais vivíamos no limbo, desconhecíamos uma realidade chamada ex-combatentes.
As sementes cresceram, a insatisfação perante as desigualdades e as dificuldades experimentadas pela generalidade da população no seu quotidiano, deu lugar, a um descontentamento cada vez mais profundo, em democracia o alvo do mal-estar da população é sempre o Governo, uma realidade com a qual as autoridades se sentem ainda bastante desconfortáveis.
A população foi perdendo medo em expressar o seu descontentamento, enquanto, no executivo o medo foi-se apoderando. Um medo justificado, o medo do contágio transversal a toda à sociedade, parece-me, que aconteceu, o sintoma, as manifestações dos ex-combatentes na baixa de Luanda com as forças da ordem, obrigadas a usar o recurso à força para dispersar. Tanta desigualdade, tanta riqueza mal distribuída, apenas, poderia contribuir para uma bomba social, com um equilíbrio instável.
É preciso reconhecer que houve uma transformação no país, talvez, não com a velocidade desejada e nem com as prioridades estabelecidas, mas existiu uma transformação, mas é uma transformação que apenas abrange uma minoria e exclui uma maioria. Não convém esquecer que em Luanda ainda prolifera muito arsenal de Guerra e quem não tem nada a perder, não se importa de sacrificar a sua vida e a dos demais. O Governo deveria estar mais atento e consciente a está realidade porque um dia corremos o risco de acordar e não estar mais no purgatório mas sim no inferno.

terça-feira, 17 de abril de 2012

A Desintegração da UNITA?

O abandono de Abel Chivukuvuku não constituiu propriamente uma surpresa, já existiam vários indícios sobre a sua ruptura com as linhas orientadoras da UNITA. As suas divergências eram manifestas e inconciliáveis. A saída de Abel Chivukuvuku poderá ter um efeito de arrastamento noutros quadros proeminentes da UNITA e provocar uma hemorragia política no seio do partido, principalmente, se o novo projecto político de Abel Chivukuvuku tiver consistência e for mobilizador.
A posição actual da UNITA, já era frágil, devido a preponderância política avassaladora do MPLA no contexto político angolano, com uma maioria absoluta de 80%, a margem de actuação do principal partido da oposição era diminuta e extremamente difícil.
Nesta nova Era, a UNITA teve dificuldade em reinventar-se, viveu demasiado presa a um passado que estigmatiza em excesso o partido no presente, não acho que o partido deva renegar o seu legado, mas deve centrar-se no futuro. O futuro são os problemas e as carências da população, definir um modelo de desenvolvimento para o país e uma orientação política adequada. A ausência, a inercia, a resistência à mudança, possivelmente, motivaram a decisão de Abel Chivukuvuku, em iniciar um projecto político sem o peso do passado e orientado para o futuro.
É difícil determinar o impacto desta saída na UNITA, mas parece claro, que é uma decisão que beneficia o MPLA, porque parte da premissa, dividir para reinar. Pode existir uma fragmentação e dispersão do eleitorado da UNITA, algo que penaliza o partido. O dilema dos dirigentes da UNITA é determinar a sua amplitude e o seu impacto.
Registo a normalidade democrática em todo o processo, revelador de maturidade política, principalmente, num momento de extrema dificuldade para o partido, também saliento a normalidade institucional do principal partido da oposição em relação ao partido no poder. Um trajecto difícil de traçar, a credibilidade nunca se alcançou numa questão de dias.
Penso que a UNITA deve ter consciência que estamos num outro tempo, a política faz-se de outra forma, tem uma componente cada vez mais profissional, utiliza novos conceitos, o marketing político é um lugar comum, saber gerir a imagem e saber comunicar a mensagem são factores chave. O conteúdo político, económico e social também não pode ser descurado, principalmente, para quem faz oposição.
Por isso, fiquei surpreso, quando consultei o Google, com o intuito de saber, se a UNITA tinha um site na internet, para minha surpresa tem, mas pude constatar que ele apenas existe desde 2012, segundo a data expressa no copyright. Um pouco tarde, ninguém espera por ninguém, Abel também não esperou.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

O Circulo do Poder

O Poder não se ostenta, exerce-se. Esta seria, segundo a minha opinião, a observação que melhor definiria a pessoa de José Eduardo dos Santos, mas não apenas ele. Poderia também definir a pessoa de Manuel Vicente, enquanto, foi Presidente da Sonangol. A Petrolífera Estatal é a face do Poder Económico, Financeiro e Exterior de Angola, em certa medida, é a imagem de marca do país. Seguindo esta linha de raciocínio o Presidente da Sonangol é uma espécie de Ministro da Economia, das Finanças e das Relações Exteriores de Angola. Tamanho é o Poder. Questiono-me, se abandonar a Presidência da Sonangol para ocupar uma pasta no Executivo, no fundo, não é uma perda de Poder?
Quem tratou com Manuel Vicente, descreve-o, como uma pessoa discreta, afável e um duro negociador, um peso pesado de Angola, coincidência ou não, considero o perfil de Manuel Vicente muito parecido com o do Presidente da República. Não sei se será o Delfim de José Eduardo dos Santos, para uma possível sucessão, o Oráculo da Cidade Alta, é indecifrável, mas são, inquestionavelmente, duas almas siamesas na aparência, ambas conhecem o exercício do Poder, apenas, falta a uma, o exercício da Política para ambas se completarem. O exercício da Política é algo que Manuel Vicente desconhece, pelo menos, na esfera mais intima da oligarquia angolana, a forma, como souber interpretar esta lógica dependerá o seu destino.
Por vezes, uma excessiva proximidade ao Núcleo do Poder, a esfera mais intima, pode ser responsável pelo diluir do Poder de quem se aproxima em demasia, a história política de Angola, está repleta de ascensões e quedas meteóricas. A sabedoria com que se gere o espaço e o tempo, é fundamental, principalmente, para quem tem pretensões políticas maiores. Convenhamos, em Angola são várias as figuras com pretensões maiores.
Na essência, neste momento, não sei o que significa o novo papel de Manuel Vicente no Circulo do Poder, apenas sei, ser um pré-requisito necessário para chegar ao ponto mais alto. O facto, de se considerarem cenários de sucessão no seio do Poder, de existir uma linha de planeamento, apenas, é indiciador da maturidade política que começa a existir em Angola. Se, de facto, chegamos a maturidade política também seria positivo um exercício de reformulação ideológica ao nível dos partidos políticos. Os dogmas devem ficar no passado porque o futuro pertence-nos.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Os Impactos e o Poder: Sonangol vs Millennium BCP

A Instituição Financeira Millennium BCP acaba de conhecer uma profunda alteração na sua presidência, saí Carlos Santos Ferreira e entra Nuno Amado. Penso que o timing e a mudança eram necessárias, dado o enfraquecimento da Instituição Financeira. Como o próprio Carlos Santos Ferreira reconheceu, muita coisa foi feita para recuperar a solidez do Banco mas ainda pairava um custo/passivo reputacional sobre a Instituição. O maior pecado de Santos Fereira foi entrar numa Instituição Financeira em guerra com o peso de uma figura politizada, algo que, acabou por marcar toda a sua trajectória no Millennium BCP.
O sucessor, Nuno Amado, tem no seu Curriculum a Presidência do Totta Santander, o único dos grandes bancos portugueses a apresentar lucros. Creio que Nuno Amado não é uma figura mais omnipresente na Banca portuguesa devido à sombra de Horta Osório, por isso, considero a escolha acertada apesar da situação complexa em que vive a Banca portuguesa sobre o espectro do Euro.
É importante que o novo Presidente do Millennium BCP seja imune à influências accionistas, a prioridade é devolver ao Millennium BCP à imagem de grande Banco que perdeu nestes últimos anos, facto bem reflectido na cotação em Bolsa, é necessário que o Banco volte a ser uma máquina de fazer dinheiro, algo apenas possível se existir uma boa gestão.
Continuo a pensar que a aposta para recuperar a solidez financeira é a concentração accionista, o Banco deve ter como base grandes accionistas de referência, portanto, o caminho do reforço accionista da Sonangol no Millennium BCP parece-me correcto, no entanto, não é imune de riscos. A percepção de que é necessária uma maior concentração accionista não passa desapercebida ao próprio Banco, não creio que seja inocente o rumor que corre, que indica uma eventual entrada de um novo accionista chinês na estrutura do Banco. A cotação bolsista, o reforço de capital e a necessidade de liquidez proporcionam um ambiente propicio a uma nova entrada.
A estrutura de poder do Millennium BCP poderá dividir-se entre capital angolano e chinês, diga-se, em abono da verdade, a influência angolana já se faz sentir em todos os órgãos do Banco. É uma consequência natural, não faria sentido ser o maior accionista e não ter capacidade de influência/poder no Banco, mas este alegado poder não deve colidir com o trabalho da nova administração. A prioridade dos accionistas é velar por uma boa governação da Instituição, somente, assim poderá ter força para absorver os impactos e as incertezas futuras.
Os impactos, são os riscos de exposição da Instituição, nomeadamente, à divida grega, com uma eventual reestruturação ou um default no horizonte, as imparidades já se fizeram sentir na mais recente apresentação de Resultados do Banco, depois há que considerar uma eventual saída da Grécia do Euro e as consequências que tremendo desastre terá sobre a economia portuguesa, sobretudo, no seu sistema financeiro, entenda-se, Bancos. As perspectivas são negativas, tudo o indicia, somente, os mais fortes irão sobreviver.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Empreendedorismo e Imigração

Tenho assistido com interesse o novo discurso do executivo sobre o papel da iniciativa privada em Angola, com palavras de estimulo para os empresários angolanos assumirem uma maior preponderância na economia angolana. Este discurso tem como premissa uma menor intervenção do Estado na economia e dar ao privado o papel de principal dinamizador e criador de riqueza, no fundo, é liberalizar a economia, o Estado ou os seus protagonistas assumem um papel liberal.
É uma mudança radical de discurso e de pensamento, passar de um modelo intervencionista na economia para um papel de delegar funções para os privados, a questão, é saber se um modelo mais liberal funciona em economias em estados prematuros de desenvolvimento, onde os empresários não possuem massa critica e nem existe acumulação de bens de capital?
Penso que em economias em estado prematuro de desenvolvimento, o Estado tem um papel fundamental na economia definindo as prioridades de desenvolvimento e uma intervenção activa no planeamento das infraestruturas necessárias para o país, principalmente, quando o privado nacional carece de competências para assumir esse papel. No meu ponto de vista, o papel do Estado na economia angolana chega ao ponto, de ser o principal responsável para criar condições para que a iniciativa privada se possa desenvolver.
Para ser empreendedor, não basta ter uma ideia de negócio exequível, é preciso capacidade para implementar a ideia, a capacidade passa pelo acesso à capital humano, capital próprio e capital alheio. Estas condições nem sempre estão reunidas no mercado angolano, onde o acesso à mão-de-obra qualificada é difícil, bem como ao financiamento, um processo demasiado complexo, sem mencionar toda a estrutura burocrática que existe em Angola.
Curiosamente, faz-se apologia à uma posição mais liberal mas depois a prática é de um maior proteccionismo, nomeadamente, no que se refere à incorporação de mão-de-obra estrangeira mais qualificada. Não nos enganemos à mão-de-obra estrangeira mais qualificada não vem para Angola, procura outras paragens para desenvolver a sua carreira profissional de forma mais sustentada, procura condições que Angola não pode oferecer porque simplesmente não possui. No entanto, a mão-de-obra qualificada que chega à Angola é necessária porque é requerida pelo próprio mercado, senão fosse necessária simplesmente não seria absorvida. Aqui coloca-se uma questão essencial, porque razão os quadros formados nas Universidades angolanas são preteridos em relação aos estrangeiros? Porque razão o mercado faz esta distinção? Será que o ensino universitário em Angola vai de encontro com as necessidades dos empresários? Será que as Universidades angolanas trabalham o mercado e fomentam a constituição de parcerias entre a Universidade e a Empresa? Ou será que a Universidade se limita a formar quadros, sem fazer um acompanhamento da sua inserção no mercado de trabalho, deixando o recém-licenciado entregue a sua própria sorte? Será que a Universidade tem instrumentos para os recém-licenciados desenvolverem os seus próprios projectos empresariais, incentivando, deste modo, o empreendedorismo?
Nesta questão existem dois grandes malefícios para a economia angolana, o recém-licenciado que fica no desemprego, cada dia corresponde a uma perda de competências e a uma desvalorização do investimento realizado, por outro lado, o expatriado para quem Angola é apenas um projecto de vida de curto-médio prazo, quando seria do interesse do Estado e da economia angolana que o seu projecto profissional e de vida fosse de longo-prazo.